Nelson Moleiro
Tanino, o injusto vilão!

Este post é o primeiro de uma rubrica aleatória de explicações, dicas e conselhos. E hoje o eleito é o tanino!
Nestes últimos dias, em mais uma jornada de busca de vinhos e visita a quintas portuguesas de eleição, o destino encarregou-se de me levar a uma das regiões que mais gosto no nosso País, a fronteira do Dão com o Douro. E em consequência, um déjà vu transformado em brainstrorm! Na prova de um Porto Tawny 30 anos, exclamei em mim mesmo, TANINOS! “Este Porto elegantemente envelhecido vai-me fazer falar de taninos”. Isto é um pouco da minha pessoa, nos momentos mais sublimes lembro-me das coisas mais improváveis.
Ora então, a minha formação profissional, de vertente científica, mais tarde ou mais cedo teria que se fazer mostrar. Nunca me contentei com um “porque sim”. Já a minha mãe dizia: “não vás cortar o cabelo que comeste há pouco tempo”. E eu lá dizia, “mas porquê?”. “Olha...porque sempre ouvi dizer que faz mal”. Pois é mãe, eu sou rapaz, não vou tomar banho de imersão nem fazer permanente, é só cortar uns aramezitos, está descansada que não morro. É como dizer que o Sporting é um grande de Portugal. Mas porquê? Ainda não vi o fundamento e motivo para tal (eheheh)!
Quimicamente, o tanino é um polifenol, presente em várias plantas, sendo um antioxidante natural poderoso. Ele existe para proteger o vegetal do ataque de predadores, dos herbívoros. Se fosses uma videira, e estivesses a ser mastigada por uma manada de Gnus, o que farias? Sacrificavas a tua folha ou baga sob ataque, e libertavas os taninos, amargos, adstringentes, estragando o pitéu ao predador. Quem nunca comeu uma banana verde? É essa sensação de boca amarrada e seca, de ranger de dentes, que pretendo transmitir para caracterizar a acção sensorial dos taninos num vinho. Para quem usa cremalheira dentária, a sensação será ainda maior.


Nas uvas, os taninos estão presentes nas cascas, sementes e engaços (ramos dos cachos). Quanto mais espessa é a casca, maior é a quantidade de taninos. Portanto, nos vinhos tintos de tasco, carrascões, percebo a adstringência exacerbada, isto porque além de ser um vinho novo, mais alcoólico, não existe o cuidado e preocupação de limitar a acção do engaço e partes verdes da planta (ramos, caules, folhas etc), no processo de fermentação. Logo, mais taninos na buída!
E chega da seca!!!!!!!!!!!!!! Bora ao que interessa! Se és “gaja” e só gostas de brancos e rosés porque os tintos arranham na garganta, vou-te dizer porquê. Se és fã do tinto, talvez consigas perceber melhor certos aspectos neste vinho, que te poderão ajudar na hora de escolher o vinho a servir.
Grosso modo, um vinho tinto, é produzido a partir da fermentação de uvas tintas, podendo ter um "pantone" de cores vasto, com maior ou menor transparência. Os tintos envelhecidos, além de um aroma mais complexo, têm habitualmente uma textura e porte mais elegante, e no que se refere aos jovens, estes, por sua vez, são normalmente mais aromáticos e frutados.
Um vinho branco é feito a partir da vinificação de uvas brancas, normalmente sem película, tornando-se mais suave e perfumado. Se querem sentir a diferença, provem um branco sem estágio em barrica de madeira, e outro com estágio em madeira. Esta fornece alguns taninos ao vinho e vai-se traduzir no aroma e paladar.
Já num vinho rosé, fermentam-se as uvas tintas, mas neste caso sem película da uva, ou seja, é um vinho tinto fermentado como se fosse um branco. Daí, meninas e meninos, fãs do rosé e branco, vocês adoram estes vinhos porque a eles são retirados grande parte dos taninos presentes na “casca” da uva. São menos complexos e alcoólicos, tornando-se mais suaves e aromáticos, ideais para o Verão.

Eu, que já ando nesta buída há algum tempo, levado pelo gosto pessoal, vou sempre mais em busca do tinto. E se no início ia mais para os jovens e frutados, hoje gosto da componente de imprevisto que um tinto envelhecido nos trás. Eles envelhecem através da polimerização dos seus fenóis (taninos e antocianinas), perdendo cor, fruto e doçura, mas ganhando suavidade, elegância e complexidade, numa jiga-joga constante e lenta, entre oxidação e redução. Neste processo de polimerização há formação de macromoléculas, o chamado depósito, sendo fundamental a decantação. Logo, nem tudo é a dita cagança na hora de servir pah! O ritmo destas reacções é influenciado pelas condições de estágio, seja em barrica de madeira ou cuba de inox, luz, temperatura, humidade, vibrações, rolha, pH, álcool, etc. Todas estas variáveis, tornam difícil e mesmo impossível prever o momento óptimo do seu envelhecimento e maturidade, assim como saber o início do seu declínio qualitativo.

E é isto que me apaixona no envelhecimento do vinho, porque garrafas do mesmo lote, consumidas em diferentes espaços temporais, podem significar experiências sensoriais totalmente distintas, consoante os cuidados tidos na sua conservação e estágio, e a própria evolução natural do vinho em garrafa. Um vinho engarrafado pode entrar em declínio, mas passado um par de anos, recupera e vira Rei. A ideia de que quanto mais velho, melhor o vinho, nem sempre é legítima, mas se de facto acontecer, os taninos tiveram com certeza um papel fundamental!
Ora então, hora de apontar no caderno:
Não tens grande experiência, tens um jantar, então escolhe um vinho que agrade à maioria sem correres grandes riscos, por exemplo um vinho tinto jovem e frutado, sem grande complexidade, estrutura, e imprevisibilidade, com 2 a 3 anos máximo. As castas nacionais normalmente agradam aos paladares, quando conjugadas em diferentes percentagens, Touriga Nacional, Tinta Roriz/Aragonez, Trincadeira, Castelão. Já a Baga da Bairrada, e o Jaen do Dão são escolhas mais arriscadas.
Se estás entre amigos, que já detenham de alguma experiência, arrisca e brilha, investe em algo desconhecido, um vinho envelhecido, uma casta diferente, ou algo que se potencie em garrafa com o tempo. Castas autóctones como Jaen e Baga (meros exemplos tânicos), sem esquecer o meu Douro, com todo o seu vigor e enquadramento vinícola único, com castas distintas e próprias.
Cheers!

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